«Angola Janga» é uma obra a vários títulos excepcional. A
história do livro está naturalmente romanceada, até porque, para além da
tradição oral negra, de Pernambuco, só se conhecem os registos «oficiais», dos
esclavagistas portugueses e dos militares. Mas é, mesmo que romanceada, muito
bonita e dura.
Mas para além da história, «Angola Janga é uma obra de
excepção também do ponto de vista gráfico, do desenho e da técnica. Um preto/
branco cru, sem cinzentos, enxuto, sem lenimentos, africanista se pretende,
deliberadamente naïf, por vezes, e simultaneamente carregado de dramatismo. E
belo.
D'Salete procura fugir ao discurso linear sem decair no
abstraccionismo, mas a linguagem é claramente gráfica, de bd, nos desenhos, que
não são retratos ou caricaturas, mas personagens em movimento, com vida, nas
perspectivas, nos enquadramentos, nas chamadas, nas imagens cortadas, também na
intromissão ou ausência dos balões, no dramatismo de que falei, e no final, o
silêncio que sufoca, e o negro da noite.
A edição é da Polvo, de 2018, e tinha-me escapado
completamente. A Polvo editou em português de Portugal (o original é,
naturalmente, brasileiro) este magnífico «Angola Janga», que inclui introdução
e posfácio, glossário e contextualização histórica e geográfica.
Parabéns à Polvo e ao autor, Marcelo d'Salete, que
desconhecia de todo. O Brasil não pára de me surpreender. Também na banda
desenhada.
«Angola Janga, pequena Angola ou, como dizem os livros de história, Palmares. Por mais de cem anos foi como que um reino africano dentro da América do Sul. E, apesar do nome, não era tão pequeno como isso: Macaco, a capital, tinha uma população equivalente à das maiores cidades brasileiras da época.
Formada no fim do século XVI, em Pernambuco, a partir dos mocambos criados por fugitivos da escravidão, Angola Janga cresceu, organizou-se e resistiu aos ataques dos militares holandeses e das forças coloniais portuguesas.
Tornou-se o grande alvo do ódio dos colonizadores e um símbolo de liberdade para os escravizados. O seu maior líder, Zumbi, transformou-se numa lenda e inspirou a criação do Dia da Consciência Negra.
Angola Janga e Marcelo D’Salete arrebataram no Brasil, em 2018, os prestigiados troféus HQMix, nas categorias Edição Especial Nacional, Desenhista Nacional e Roteirista Nacional e ainda o prémio Grampo.
O livro foi igualmente nomeado para o mais importante prémio literário brasileiro, o Jabuti, na categoria Histórias em Quadrinhos (a atribuir em Novembro de 2018). Com 432 páginas é, provavelmente, o maior romance em banda desenhada já publicado por um autor brasileiro.»
Angola Janga, Marcelo d'Salete, Polvo 2018.
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