domingo, 30 de março de 2014

Genesis de Sebastião Salgado




Génesis, de Sebastião Salgado em Madrid
Até 4 de Maio na Fundação La Caixa

O Surrealismo n'A Ideia



O meu amigo Rui Martinho fez-me chegar o último número (duplo, 71/72) de A Ideia, «revista de cultura libertária».

Prestes a comemorar quarenta anos de (conturbada) vida, o número, grosso, é inteiramente dedicado ao surrealismo: textos de cinco dezenas de pensadores, surrealistas ou nem tanto, entre histórias, ensaios e contributos diversos.


 Textos de valor diferente, inevitavelmente, entre o «conheci o X, era um gajo porreiro», alguns ensaios sobre a pertinência de incluir Y entre os surrealistas, histórias onde se cruza o grande cisma do Café Gelo com as impertinências do Pacheco, alguns equívocos do tipo «o surrealismo é uma forma de humor», ou a interrogação do lugar dos surrealistas entre os movimentos políticos e sociais, ou enfim alguns poemas; constituem uma preciosa reunião de registos destinados a memória futura da História do Surrealismo em Portugal, a fazer.
Fala-se de Cruzeiro Seixas, Herberto Hélder, Mário Botas, Mário Cesariny, Lima de Freitas, António Maria Lisboa, Mário Henrique Leiria, Luiz Pacheco, Ernesto Sampaio, Carlos Eurico da Costa, António Telmo, António José Forte, Virgílio Martinho, Al Berto, e inúmeros outros, entre referências fugazes e recordações, surrealistas, vagabundos das letras e das artes plásticas, também os penduras e os diletantes, toda a qualidade de artistas, filósofos, pensadores, surrealistas, neo-realistas e outros.

Registo precioso, como disse, peca pelo excesso do panegírico e falta-lhe o pico a azedo da neura, da maledicência e da crítica, que afinal sempre temperou a História do Surrealismo em Portugal.

O surrealismo merecia mais um número ou dois. Afinal o surrealismo é uma forma saudável de vida.

Direcção e edição de António Cândido Franco.

A Ideia, 71-72, Novembro 2013

domingo, 23 de março de 2014

Um Quente Agosto




Realizado por John Wells, conhecido principalmente como produtor, também escritor e argumentista, tem no currículo alguns episódios do ER (Serviço de Emergência) e The West Wing (Os Homens do Presidente).
Um Quente Agosto (August: Osage County) baseia-se numa peça de Tracy Letts com o mesmo nome. 
A história alterna (hesita) entre o drama e a comédia no retrato de uma família do Midwest, reunida pelo falecimento do pai. No decorrer do jantar que se segue ao funeral, as tensões começam a crescer entre a mãe autoritária e cruel e as filhas, e o conflito estala.

O problema é mesmo a história. O que até três quartos do filme pareceu ser o retrato de uma família disfuncional, acaba por se transformar numa história rasca. A necessidade de oferecer uma explicação (rasca) para a amargura da família, vulgariza o filme, retira-lhe a densidade e o interesse.

 Uma realização escorreita e um excelente grupo de actores - com destaque para Meryl Streep no papel da mãe amarga – valeram ao filme alguns prémios e nomeações para o elenco.

The Monuments Men




«Baseado  numa história verídica». Pois parece que nos últimos dias da guerra (a segunda grande) os aliados designaram um grupo de especialistas para impedir que os alemães escondessem ou destruíssem as inúmeras obras de arte que foram saqueando ao longo da ocupação da Europa.
Se a história é verídica, acaba por ser irrelevante: o filme é completamente pateta e nem sequer a analogia que lhe foi sendo atribuída com a série Eleven (via George Clooney) o favorece/ desculpa: diverti-me mais nesses outros. 
Mesmo se o filme se apresenta como um simples exercício de entretenimento, a inconsistência da história escondida em lamechice e boas causas que parecem desmentir a despretensão, afunda-o irremediavelmente.
Imagino que George Clooney está a precisar de dinheiro e esta é uma receita garantida, mas, até pelo que ele já fez antes (Syriana; Good Night, and Good Luck), a indigência não tem desculpa.

The Monuments Men, George Clooney, 2013 



terça-feira, 4 de março de 2014

Au revoir, Mr. Resnais

Alain Resnais 1922 - 2014

Morreu, com 91 anos, Alain Resnais.
Alain Resnais é o responsável por alguns dos grandes filmes do cinema europeu. 
O meu preferido é de longe, Providence, um devastador exercício sobre o envelhecimento e a morte; mas também O Meu Tio da América - uma «efabulação social» disfarçada de documentário, com tanto de drama quanto de cáustico; um originalíssimo e polémico O Último Ano em Marienbad, o casamento mal amado da literatura e do cinema; e Hiroxima Meu Amor, um «drama psicológico» com a devastação como pano de fundo.
O último filme que vi dele foi Corações; várias histórias cruzadas com «o coração» no centro. Excelente.
Au revoir, Mr. Resnais.


Providence (1977)




O Meu Tio da América (1980)
 


O Último Ano em Marienbad (1961)




Hiroxima Meu Amor (1959)

Corações (2007) 






sábado, 1 de março de 2014

O Perseguidor

 
No ano em que se celebram 100 anos do nascimento (e 30 anos do desaparecimento) de Julio Cortázar, um dos mais importantes escritores do século XX, a homenagem da Fundação Saramago e da Casa da América Latina faz todo o sentido.
No espectáculo do São Luiz foram lidos excertos de O Perseguidor por José Rui Martins (Trigo Limpo – Teatro ACERT), conto onde Cortázar homenageia o saxofonista Charlie Parker.
A música de Charlie Parker interpretada pelo Quarteto de Carlos Martins serviu de pano de fundo à leitura, que foi também ilustrada pela projecção de imagens retiradas do trabalho do desenhador José Muñoz.

Para um espectáculo que se poderia esperar monótono, a leitura de José Rui Martins, que se movia entre vários espaços no palco, foi bastante dinâmica, e o contraponto com a música de Carlos Martins muito eficaz.   


 O conto O Perseguidor pode ser encontrado em língua portuguesa na colectânea Blow-up e outras histórias (Portugal) e As Armas Secretas (Brasil). 
Existe, pelo menos publicado em francês - a versão que conheço -, uma edição magnífica sob o título de L'Homme À L'Affût onde o texto é ilustrado pelos desenhos de Jose Muñoz.

 

(A propósito desta recolha, um dos outros contos - Blow Up -, inspirou Michelangelo Antonioni para o argumento do filme com o mesmo nome.)
 

São Luiz, Jardim de Inverno, 12 de Fevereiro 2013, 18.30

Servidões


«
hoje, que eu estava conforme ao dia fundo, 
fui-me a reler alguns dos meus poemas, 
e então caí abaixo de mim mesmo, 
e era só o que me faltava:
sáfira safra
- nem as mãos me serviam, 
nem a dor escrita e lida me serve para nada
»




Servidões, Herberto Helder, 2013