quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

Presentes de Natal

Este ano tenho sugestões de prendas de natal literárias. E sem delongas, aqui vão elas. 

Mas é Bonito, Geoff Dyer

A minha primeira recomendação é, como propus em JazzLogical, o livro de Geoff Dyer, Mas é Bonito, que já foi aqui objecto de um post antigo, de 2014.
O livro, editado pela Quetzal, pode ter de ser encomendado em virtude da edição ter quase dez anos. Mas ele está disponível na editora, é belíssimo e é um excelente presente.

Relógio de Cuco/ A Caça, Virgílio Martinho

A Companhia da Ilhas tem vindo a editar toda a obra de Virgílio Martinho. Depois de Festa Pública/ Orlando em Tríptico e Aventuras/ Rainhas Cláudias ao Domingo em 2012, e de O Grande Cidadão em 2022, eis que renasce em todo o seu esplendor o Relógio de Cuco, aqui acompanhado de A Caça
Eu descobri o Virgílio Martinho com 18 anos, e se algo tenho a dizer é que pouco escritores conheço com este dom de escrita como o Virgílio. Uma escrita elegante, total, do ponto de vista vocabular ou gramatical, erudita e prosaica, poética, dramática e humorada, escorreita, ritmada, que apetece devorar. Surrealista às vezes e neo-realista culto, ou pelo contrário, Virgílio merece, precisa, ser redescoberto.
As duas histórias são bem diferentes: mais poética e intimista O Relógio de Cuco (por ele foi acusado de neo-realista); divertida e surpreendente A Caça. Acreditem: já não se escreve assim. O livro tem um prefácio de Vítor Silva Tavares, editor da & etc e outro monstro das letras, num texto delicioso publicado em 1995.
 Embora a edição seja recente pode ser mais difícil encontra-la. Nada como pedir à Companhia das Ilhas. 


Santa-Bárbara Capista de Zeca, Abel Soares da Rosa

A minha quarta sugestão é um curioso livro sobre as capas dos discos de José Afonso, profusamente ilustrado, e com as histórias em torno das capas de Santa-Bábara, o capista do Zeca. E assim se chama – Santa-Bárbara Capista de Zeca - a belíssima recolha de Abel Soares da Rosa, com edição da Lusitanian. 




Andanças do Demónio, Jorge de Sena

Andanças do Demónio, recolha de histórias entre os anos 40 e 60 do século passado, é a estreia de Jorge de Sena no domínio da ficção. Histórias fantásticas, demoníacas ou extraordinariamente comezinhas, o livro revela um Jorge de Sena menos conhecido, mas também a sua pena luxuriante, aqui ao serviço da imaginação: «O demónio destas andanças em forma de conto não está em mim, está no mundo (e, com funda pena o digo, não viaja para fora de Portugal, como tanto conviria).» Edição Guerra e Paz.


 
Música negra, Leroi Jones (Amiri Baraka)

 Música negra, de Leroi Jones (Amiri Baraka) é uma recolha de textos publicados nos anos 60, dispersos por revistas da especialidade, tardiamente chegado ao nosso convívio. É um livro datado, mas que ajuda a compreender o fenómeno free-jazz e a influência que ele teve nos nossos divulgadores desse período. Radical nas propostas, a edição contempla um texto mais recente em que o autor admite o excesso dos textos antigos, mesmo reafirmando a sua razão de ser. Prefácio de Kalaf. Edição Orfeu Negro. 





Crónicas de Lisboa, Ferreira Fernandes e Nuno Saraiva

Crónicas de Lisboa é uma banda desenhada sobre Lisboa, nascida a partir de uma conversa com Catarina Carvalho, directora do jornal Mensagem de Lisboa. Com argumento delirante de Ferreira Fernandes e o desenho desbragado de Nuno Saraiva, Lisboa e os lisboetas que a fazem contam as suas histórias ou os autores lhas roubam, e por elas passam a Júlia Florista, o Carlos do Carmo, a Madame Brouillard, a Caparica, o Santo António, como a Catarina Carvalho anuncia logo no prefácio, mas ali entram o Benfica, o clube e o bairro, o Rei Leão Peyroteo, o 25 de Abril, os fascistas e os comunistas, o Rossio e o D. Pedro, o Imperador do Brasil e Rei de Portugal, a Brasileira e o Bartolomeu de Gusmão, o Almirante Reis e o Marquês de Pombal, Josephine Baker e a Dona Maria II, o rock, o fado e os olissipógrafos. Um desvario com edição da Asa.



Histórias de Jazz

E as minhas propostas completam-se enfim, com toda a lata, com as minhas Histórias de Jazz, de que não vale a pena falar mais, até porque delas falei aqui mesmo na semana passada.
Edição da Guerra e Paz.





E tenham um bom Natal, dingalingaling!



domingo, 3 de dezembro de 2023

Histórias de Jazz



Histórias de Jazz são catorze histórias que o jazz inspirou. São histórias intimistas, de amores e desamores desesperados, por vezes escandalosos, de sexo, traição, sangue, suor e lágrimas, amizade, humor, fantástico e poesia. Catorze histórias que evocam músicos, entre Miles Davis, o esquecido Frank Morgan e o irreverente e genial músico de rock Frank Zappa, ou canções que o jazz eternizou, como Jitterbug Walz ou For All We Know.
O livro conta ainda com uma magnífica capa com desenho do ilustrador e desenhador Nuno Saraiva e um excelente grafismo da editora (e está muito bonito). E fui eu que escrevi.

O livro foi editado pela prestigiada Guerra e Paz, e já está nas livrarias, mas pode ser adquirido directamente à editora.


Tintin 77 anos

 

O Tintin, a revista dos jovens dos 7 aos 77 anos faz, faria, 77 anos, e a Le Lombard publicou uma
volumosa edição comemorativa. 400 páginas de evocação e aventura, onde os jovens da minha idade encontrarão nostalgia, mas também algum desencanto. Muitos dos desenhadores já desapareceram, mas também a juventude é irrepetível, mas também muitas das histórias não poderiam ser escritas (e desenhadas) hoje – e enfim percebe-se porque é que a revista terminou. Muito do mundo selvagem que se imaginava – as utopias - desapareceu, por motivos políticos (e na altura viviam-se os restos dos colonialismos), ou porque foram assolados pelo turismo que chegou a todo o lado, ou porque hoje compreendemos que não podemos andar a matar indiscriminadamente animais selvagens; aliás queremos protegê-los; ou porque compreendemos que os índios da Amazónia ou de África têm direito aos seus territórios e nós não somos os inocentes aventureiros que gostávamo-nos de nos pintar. Enfim, nada é simples neste mundo em que vivemos, mas o mundo mudou e hoje sabemos.

Mas esta edição pretende apenas celebrar a nossa juventude e a nossa inocência, e ela está cheia de depoimentos e histórias curiosas desse tempo e de banda desenhada também; de histórias recriadas como foi possível.  

Uma edição para colecionadores nostálgicos.

Só os amantes sobrevivem!



Voltei a ver o Só os amantes sobrevivem (Only Lovers Left Alive) do Jarmusch, e quero mudar a minha classificação.

Que importa o remate final, que importa o demais, quando se tem aqueles actores (quando se tem a Tilda Swinton, e ok.... o Tom Hiddleston), aquele ambiente, a libido sentiendi, e aquela música!

E, mesmo sem emendar o que escrevi sobre o final, este é um grande filme, servido por uma direcção magistral.






Já agora, e porque nunca escrevi sobre ele, o filme de 2019 The Dead Don't Die é uma merda; não há outra forma de o dizer. Percebe-se que é uma paródia aos filmes de zombies e de ficção científica barata, mas é tudo menos conseguido. Não vale a pena perder tempo; no melhor pano cai a nódoa: uma merda.  

A Dona Giorgia

 

Eu até nem queria voltar a este assunto da religião. Mas aconteceu que me enviaram um vídeo da Sra. Primeiro Ministro da Itália, em que ela apela a que se volte a fazer o presépio (creio que em vez da árvore de natal), em nome dos nossos valores e da nossa religião. Nada que não se tenha visto por cá, é claro.

E realmente não deixa de ser curioso. Ela talvez até que tenha razão, sei lá. Mas acho que ela deveria ter cuidado. Porque (e agora aqui vai um insulto misógino: preparem-se) de acordo com os valores dessa civilização que ela evoca, a senhora deveria estar a cozer meias e não a dar bitaites sobre política ou cultura, que é coisa de homens. Porque nessa cultura ela é uma coisa sem coração nem inteligência, mas apenas uma excrescência de uma costela. 

Que a Dona Maria tenha inventado aquela para o marido de que tinha sido fecundada por deus (e que ele tenha engolido), vá que não vá, nós até entendemos. Agora dois mil anos depois pôr-nos a fazer presépios… nossa senhora!!!!

Ó Dona Giorgia, deixe-me dizer-lhe umas coisas: foi porque as mulheres e os homens contestaram essas tretas que nós hoje somos civilizados. Foi porque Galileu questionou essa cultura e religião que a senhora invoca que nós hoje sabemos que a Terra não é o centro do Universo. A nossa civilização está marcada pela religião, mas pela negativa. A nossa civilização foi construída contra e apesar dessa cultura anacrónica, insciente, retrógrada, serôdia.

Não me lixe, Dona Giorgia. Vá cozer meias.