domingo, 4 de dezembro de 2016
sábado, 27 de agosto de 2016
EVOA - Rapinas Noturnas
EVOA
quinta-feira, 25 de agosto de 2016
Uma aventura com o meu filho (5)
Vila Nova de Foz Côa é uma terra triste. Envelhecida, mal
envelhecida, acusa todos os males da desertificação e da emigração forçada, e
não parece ser capaz de valorizar o pouco (muito) que tem. Foz Côa não tem
oferta de hotelaria ou de restauração, e o município está tão pouco preparado
para o turismo quanto os habitantes. Um hotel, uma hospedaria, um albergue de
juventude e algumas casas de turismo rural nas redondezas e um único
restaurante – a primar pela vulgaridade - no centro e alguns outros dispersos,
com horários estranhos. A vila está degradada, revelando um desleixo que não se
compreende, com um pequeno núcleo histórico mal tratado. Pode apontar-se a
pobreza da região ou a falta de dinheiro para recuperar as casas velhas
atingidas pelos males do tempo ou da emigração, mas tudo o que se revela em Foz
Côa do inqualificável espólio pré-histórico, são uns candeeiros de gosto
duvidoso. Dir-me-ão que é uma observação injusta e que eu não conheço a real
situação financeira da vila, mas esta é a observação que um forasteiro pode
fazer. Mas porque é que o posto de turismo fecha às 17.30 no pico do turismo? -
Vila Nova de Foz Côa ignora as gravuras e quase toda a pouca oferta turística é
deixada para o investimento exterior.
É difícil comer em Foz Côa. Dir-me-ão que não existem
restaurantes porque não existe procura no resto do ano, mas eu não compreendo
como os poucos tascos abertos apenas têm para oferecer cerveja, café e batatas
fritas de pacote. Qual é o investimento necessário para ter pão, presunto e
queijo? Em qualquer ignota aldeia espanhola é possível picar das oito da manhã às duas da madrugada (com excepção para a
hora da siesta), mas em Foz Côa a
pouca oferta resume-se a uns poucos restaurantes com cadeiras e mesas feias -
de plástico e oferecidas por uma qualquer marca de cerveja -, com horários
rígidos e pratos de secretos e hambúrgueres, com fecho semanal no único mês do
ano em que têm clientes. Produtos locais, horários generosos, uns simples
petisquitos: nada! E lamentam-se!
A oferta de camas é ridícula, obrigando à realização de
visitas relâmpago, organizadas a partir de empresários exteriores: o único
sítio para dormir que encontrámos foi um último quarto no albergue de
juventude! – É a pescadinha de rabo na boca: não existe oferta porque não há
procura e não há procura (ela existe, mas é deixada para o exterior) porque não
há oferta.
Não existem empresários locais com discernimento para investir
no turismo local, e a edilidade não quer saber do turismo da cultura para nada
e o pouco de animação que existe na região parece resumir-se às festas
religiosas que se centraram todas no mês de Agosto, com procissão, folclore,
bandas pimba e bailaricos. Não estava propriamente à espera de concertos de
Jazz ou de música clássica, mas parece-me que quando se promove a indigência, a
indigência tem tendência para prevalecer.
Vila Nova de Foz Côa não é uma vila agradável de visitar. Vila
Nova de Foz Côa não gosta das gravuras pré-históricas. Não aconselho as grandes
excursões, porque a visita às gravuras e ao museu merecem uma observação
demorada e atenta, mas a reserva prévia de dormida e um farnel parecem-me
avisados.
À procura das ruínas do acampamento romano fomos parar a
Allariz, uma cidade galega de que creio nunca ter ouvido falar antes. Cidade
pequena, de património granítico valorizado, com imensa vida e turismo
eficiente. Não vale a pena descrever-vos o que é um fim de tarde no centro da
cidade (uma qualquer localidade espanhola, seja galega, andaluz ou catalã – e
deve ser provavelmente o que os une), com toda a gente a beber e a petiscar na
rua, mas há uma vida e um entusiasmo naquela peculiar forma de viver – de estar
- que contrasta com o nosso.
Depois o contraste prolonga-se por tudo. De Vila Real a
Chaves fomos pela autoestrada – a pagar, claro -, e entrámos em Espanha por uma
muito boa estrada que se dirigia a Orense – grátis, claro. Descemos de umas
ruínas romanas num pequeno aglomerado de casas, mas com um museu dedicado às
ruínas, por uma estrada terciária, mas cuidada e sinalizada, para entrar em
Portugal por um caminho de cabras. O contraste é de gargalhada. Uns quilómetros
abaixo localiza-se o misterioso mosteiro de Pitões de Júnias. À entrada, um
grande cartaz avisa os visitantes do risco de ruir das pedras seculares
(anteriores à nacionalidade) do mosteiro…
Uma aventura com o meu filho (4) - Museu Nadir Afonso
Dedicado ao pintor Nadir Afonso, com projecto arquitectónico
de Siza Vieira, o museu – acabado de inaugurar - foi outro momento alto da
minha viagem com o Afonso.
Elegante e engenhoso, o Museu Nadir Afonso ergue-se alvo junto
ao Rio Tâmega, sobre estacas - paredes com rasgos de figuras geométricas que
parecem brincar com as telas do pintor. Três salas de exposição de generosa
dimensão, uma principal em rectângulo, uma segunda em corredor de comprimento
igual à sala principal e uma terceira de forma irregular, de pé direito muito
alto, jogando com a iluminação aqui artificial, ali natural, discretamente,
parecendo abdicar de si enquanto objecto artístico, dirigindo todo o enfoque
para as pinturas.O museu impressiona também nos detalhes. Siza Vieira é um perfeccionista, é sabido. Mas a perfeição leva-o a controlar todos os detalhes, desde o mobiliário ao ar condicionado, dos materiais ao acessório. Muito do que o público pode ver não lhe é perceptível, e apenas se sente na naturalidade com que se impõe. Da subtil inclinação dos mármores dos acessos (que orientam as águas pluviais e que só os olhos dos arquitectos percebem) aos puxadores das portas, das janelas que se abrem para aquelas árvores à iluminação e ao sistema de segurança, e da janela de mais de duas dezenas de metros da sala lateral sem uma única coluna a sustentá-la – uma genial peça de engenharia que evoca a Pala.
Foi possível ainda visitar uma parte do museu reservada, escritórios e salas de ocupação diversa, e uma residência concebida para ocupação do artista, infelizmente terminada já após o seu falecimento, mas que permite acolher um artista, durante um largo período, em excelentes condições.
Com umas largas dezenas de obras de Nadir Afonso expostas, e muito mais guardadas em sala reservada, a exposição actual permite várias leituras – temáticas ou históricas - da vida e arte do pintor.
O museu é um must. Longe dos circuitos do turismo de arquitectura, o Museu Nadir Afonso merece uma visita prolongada, pelo extenso espólio do pintor, mas também pela obra única que é a obra arquitectónica de Siza Vieira.
Uma aventura com o meu filho (3) - Gravuras rupestres do Côa
A visita às gravuras é, naturalmente, obrigatória, até
porque elas são o leitmotiv do museu.
A visita através do museu deve ser reservada com antecedência, mas existem
alguns guias particulares acreditados, que podem conduzir os visitantes aos
três núcleos autorizados do Parque Arqueológico: a Canada do Inferno, a Ribeira
dos Piscos e a Penascosa. Visitámos a Canada do Inferno e a Penascosa, sendo
que a visita a este último núcleo foi realizada de noite.
A visita ao núcleo da Canada do Inferno foi feita bilingue -
os outros dois visitantes eram suíços franceses que também falavam inglês.
Pudemos observar as gravuras de (creio que) cinco pedras de xisto, situadas
perto do leito do Rio Côa ao longo de quinhentos metros, após um percurso
realizado em jeep, onde estavam localizadas algumas dezenas de gravuras
realizadas com técnicas diferentes – picotado e abrasão -, por diferentes
autores, em tempos diferentes, tendo como motivos basicamente quatro animais:
cabras, cavalos, auroques e veados. Datadas de até há 25000 anos, as gravuras são
impressionantes de vida e mistério.
A interessante visita de duas horas foi conduzida pelo
informado técnico Marcos, que ajuntou informação sobre a vida natural e a
história da ocupação humana do parque.
A visita a Foz Côa haveria de ser completada com uma visita
nocturna às gravuras que ofuscaria a visita da manhã. Um contacto de última
hora com uma outra técnica – Bárbara Carvalho –, guia e arqueóloga, levou-nos à
Penascosa, um vale situado a 6 Km de Castelo Melhor, por um caminho apenas
acessível de jeep e, como a Canada do Inferno, fechado ao público não
autorizado.
A Penascosa é um vale fechado, com um horizonte que se situa
bem acima dos nossos olhos, obstruindo qualquer poluição luminosa ou sonora.
Tivemos a sorte de realizar a visita numa noite de quarto crescente, em que a
Lua se pôs muito cedo, deixando ver um céu estrelado fantástico; como disse,
sem qualquer poluição luminosa, o que é raro de observar para um citadino. O
silêncio apenas era cortado pelo coaxar ruidoso das rãs que deixavam adivinhar
o Côa a apenas alguns metros. A visita foi sempre acompanhada ainda por
milhares (milhões?) de mosquitos, incomodativos mas não agressivos, morcegos e
ainda aranhas (inofensivas mas aos milhares), que se revelavam à luz da
lanterna da Bárbara.
E se a observação das gravuras da Canada do Inferno nos
tinha impressionado, as gravuras da Penascosa - os traços evidenciados pelas
sombras produzidas pela luz artificial, que permitiam de forma mais eficiente
diferençar os traços -, transportaram-nos para um passado longínquo e
misterioso: o princípio da arte, rituais anímicos, a beleza primordial, o
enigmático insolúvel da vida dos nossos antepassados.
É óbvio que o cenário nocturno – o que não se podia ver -, o
firmamento estrelado, o silêncio insistente das rãs, a natureza agreste, em
muito contribuiu para o deslumbramento que experimentámos. A isto acresceu a
informação apaixonada da nossa guia, interrogando, sugerindo, revelando, e eu
diria que – também graças a ela - a visita se tornou numa outra experiência verdadeiramente
reveladora.
E creio que em ambos os casos a visita deve ser efectuada em
pequenos grupos e com informação e condução avisada, sob o risco de se perder o
essencial.
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